Eu gosto de fazer trilhas, mas tem um momento em trilhas mais longas que é meio chato, a volta, não sei explicar ao certo porque, mas pra mim parece com refazer algo recentemente feito, ainda muito vivo na memória, então tem um apelo bem menor. Há vários tipos de trilha que tentam minimizar isso, entre as mais comuns estão as travessias e os circuitos.
Os circuitos se valem de caminhos bem diferentes, com atrativos diferentes, para sair de um lugar e voltar a ele, o mais interessante que fiz foi sem dúvida Torres del Paine, mas nem sempre um circuito é adequado, especialmente quando a trilha envolve serras, nesses casos as travessias são muito mais comuns.
Travessia envolve logística, sai de um ponto, chega a outro ponto, mas geralmente vale a pena.
Conheci o parque da Bocaina quando ainda era bem pouco frequentado, a estrutura do parque já era muito boa, portaria, guardas, a primeira parte da trilha é feita por uma estrada de terra, havia até a possibilidade de apoio em emergências, mas a partir do segundo dia um outro universo se apresenta, com parte da trilha calçada em pedras enormes, construída por escravos para suportar mulas pesadas levando riquezas e notícias do interior do Brasil para um importante porto na época, Parati.
O caminho que fazemos acaba normalmente em Mambucaba, um distrito de Angra dos Reis, bem próximo das usinas nucleares (não consigo sentir nada de bom em usinas nucleares sendo construídas próximas a um parque tão bonito, mas já estão lá, pouco se pode fazer a respeito, deixo aqui meu protesto!), são praticamente 65 km (50 se conseguir evitar a caminhada após o final do parque até a cidade), mas exceto a distância e eventuais dias chuvosos e uma ou duas ladeiras mais íngremes, a trilha é bem fácil.
Em uma das primeiras vezes que fiz essa trilha um momento engraçado ficou na memória, no fim do segundo dia paramos em um belo a beira do rio, o lugar era bem interessante, além de bonito era confortável, plano para as barracas, com agua abundante pra banho e cozinhar, e o fato de chegarmos cedo nos deu oportunidade pra descontrair.
Ninguém no grupo questionava a qualidade da água do rio, estávamos ainda na parte alta do parque, as águas bem translúcidas e quase geladas enchiam os cantis e panelas, antes mesmo de montar as barracas aproveitamos a abundância. Mas foi nesse momento que um colega apontou pra garrafinha transparente de água que outro usava como cantil e disse, “parece sujeira”, o colega já tendo tomado toda a água foi olhar o que estava no que restava próximo do fundo da garrafa.
Não era sujeira não, mas muitos girinos, pequenos e agitados, na sede meu colega havia enchido a garrafa e já aproveitado sem sequer verificar o que havia nela, bem, acho que pela primeira vez tive a certeza que sapos não influenciam no gosto da água, pelo menos enquanto girinos.
Após alguns segundos de silêncio, todos rimos, afinal não havia diferença dos girinos na garrafinha ou no rio para quem toma a água, mas certamente o pequeno momento meio tenso ficou na memória.