Deserto do Atacama e Arredores

Ao chegar em San Pedro de Atacama eu já estava há uns 20 dias na estrada, não tinha nenhuma roupa limpa mais e fiquei animado ao ver a máquina de lavar no albergue, mas havia algumas nuvens estranhas, meio escuras, tive medo e fui perguntar na recepção:
– Posso usar a máquina de lavar? Questionei.
Claro, quando quiser, sorriu a recepcionista.
 – E hoje, será que chove? Retruquei.
Então uma larga gargalhada se ouviu, vindo de dentro da pequena recepção, de lá surgiu um senhor com sorriso largo que foi logo dizendo:
Não se preocupe, AQUI NUNCA CHOVE!
 
Claro que ele estava exagerando, há estatísticas que hoje conheço de pequenas garoas a cada 10 anos no Atacama (acho que isso não conta muito, né), mas entendi o recado, e mesmo se garoasse, o clima era tão seco que possivelmente não iria atrapalhar as roupas no varal, e assim comecei minha estada por lá, sorrindo. (PS: As roupas não levaram mais de 3 horas pra secar por completo e nada de chuva)
 
San Pedro era vila, ou quase isso, uma única rua, casas de barro em sua maioria, poucas com telhado, carros se contavam nos dedos, o chão de terra batida parecia ter uma camada eterna de poeira, e o povo era muito atencioso. A temperatura era alta durante o dia mas esfriava bem a noite, eu espirrei e tossi sem parar na primeira hora, mas depois passou, acho que foi só a aclimatação com a baixa humidade, o dono do albergue ficou meio desconfiado, ele tinha alguma neurose com resfriado, me atormentou a semana toda.
 
Não tinha uma programação fixa, resolvi que iria meio sem rumo, então fui ao centro atraz de roteiros interessantes, não foi nada trabalhoso, metade das casas eram na verdade agências de receptivo, com várias opções para a região, fechei um pacote e não parei na pousada nenhum dia mais, foi bem legal.
 
Primeira Parada: O “Vale da Lua”
O nome não é exagerado, vales de terra batida tão secos que se ouve o estalar dos passos, rodeados por paredões que parecem arenito, que ficam avermelhados ao entardecer parecem muito um cenário lunar, talvez até alimentem algumas teorias da conspiração, mas pra mim foi como uma criança num parque de diversões, andei muito pelo local, não cansava de procurar um ângulo diferente e adorei ouvir os estalos da terra enquanto andava.
 
Segunda parada: “Vale da Morte”
Próximo do Vale da Lua este tinha mais diversidade, pequenas grutas contrastavam com alguns paredões e a terra era mais avermelhada ainda, felizmente sem humidade pouca terra aderia a roupa, bastava bater um pouco e saia tudo, ainda me sentindo inspirado andei bastante, entrei em pequenas grutas, subi pequenos morros e cacei meus ângulos para foto como de costume, mas no final do dia uma surpresa, uma curiosa nuvem no horizonte conseguiu dividir o sol ao meio, parecendo haver dois, sem dúvida a sensação de que eram de 2 existia. Era só uma ilusão, embora bem bonita.
 
Terceira parada: Salares
Bem mais distantes do vilarejo os salares envolviam uma horinha de transporte, saímos cedo, mas compensou, ver grandes planícies esbranquiçadas chegava a doer nos olhos, visíveis só os flamingos, que se alimentam de algo nas águas salgadas, não tenho certeza se são algas ou pequenos micro organismos, o guia se limitava a dizer um nome estranho, mas não o que esse nome estranho era, desconfio que ele não sabia.
 
Dessa dieta vem a cor rosada dos flamingos, presente especialmente nas juntas, o resto muito branco se confundiria com o sal no chão não fosse o azul profundo das lagoas que se formavam sobre partes do salar, onde as aves preferiam ficar.
 
Protegidos por lei, os salares se mantinham em paz, para nós turistas chegar a borda dos mesmos já era um privilégio, o guia explicou que pouca gente morava na região também, aparentemente o ar “salgado” não é nada saudável além de causar cegueira a quem passa a vida muito próximo dele, mas na região havia um vilarejo mais organizado que Sam Pedro, certamente mais antigo, casas de pedra e uma igrejinha (fechada) estavam presentes.
 
Quarta parada: Lagunas de Altiplano.
A visita às lagunas de Altiplano veio no pacote quase sem custo, não estava entre as recomendações no guia que eu tinha, talvez porque na Bolívia há lagoas maiores e mais famosas, eu não esperava muito delas, mas o contraste dos dias anteriores tornou o passeio muito agradável.
 
Após subir uma serra o clima mudo, esfriou demais, mas além disso mudou também a paisagem, os vales deram espaço a montanhas suaves, mudo a cor das águas, do azul profundo nos salares para um verde esmeralda e até a cor da terra, agora menos vermelha, lugares tão próximos e tão diferentes, interessante isso!
 
O grupo era minúsculo, isso tornou o passeio bem flexível, estava frio então nada de nadar, mas a humidade tornava o ar bem melhor, caminhamos ao redor das lagoas trocando várias informações sobre a sequência da viagem de cada um, e as fotos que ganhei estão entre as minhas prediletas, como sempre onde menos se espera…
 
Quinta parada: Geiser del Tatio
Não deixaria passar em branco a oportunidade de conhecer gêiseres, certo? Afinal não existem no Brasil e eram pura novidade, mas acordar as 3 da manhã não é meu forte, eu cheguei ainda meio sonolento aos gêiseres as 5 da manhã, diferente de mim essas formações tinham hábitos matinais, começavam cedo seu show.
 
E como é complicado fotografar geisers, mesmo tendo tirado as fotos tenho alguma dificuldade de entende-las, além de ser completamente imprevisto a hora que eles resolvem espirrar, há muita (demais mesmo) fumaça e um leve cheiro de enxofre no ar.
 
Não se pode ficar muito perto dos pequenos respiros que produzem os geisers, o guia ficava o tempo todo tirando as pessoas de lá, afinal a água sai meio quente, cerca de 70-80 graus e isso queima bem 😃.
 
E reforço, mesmo acordando as 3 da manhã e tendo que forçar muito o ajuste das fotos pra achar algo que se pareça com um gêiser, foi muito legal! Todos riam quando tentavam driblar os guias e depois saiam correndo a qualquer respingo saltando do respiro, muitos adultos voltando a infância 😃. 
 
E pra relaxar nesse dia, depois dos gêiseres fomos a termas, afinal subimos a serra para nos aproximar dos vulcões, havia muita água quente nos arredores…
 
O Atacama era minha primeira parada no Chile e começou com o pé direito, foi quase uma semana na região e muito divertida!
 
Em tempo, quando achar uma foto que parece sem qualquer razão de estar aqui, ache a lebre, é enorme!