Bretanha e o Monte Saint-Michel na França

Quando fiz meu roteiro eu havia reservado duas semanas para Paris, não apenas pelo que a cidade oferece, sem dúvida nem duas semanas seriam suficientes, mas também porque meu voo de retorno ao Brasil saia de Paris e eu estava enfrentando alguns contratempos para entrar na França após quase 1 ano na Europa, na época a França exigia visto para brasileiros, diferente da Alemanha onde havia passado maior parte do tempo, e justificar, enfim, isso é outra história.
Tudo acabou dando certo, cheguei a Paris numa noite agradável no final do inverno e o albergue já estava reservado e pago para todo período, ao avisar minha família que eventuais problemas como o retorno estavam equacionados eles me sugeriram visitar parentes que moravam em Paris (eu até me irritei com essa informação, afinal todos os contratempos poderiam ser contornados se soubesse disso antes, mas ok, resolvi conhece-los)
Um casal mais que simpático, com um filho ainda pequeno que morava no bairro da bastilha me recebeu de braços abertos, a conversa foi fácil e longa, entre as histórias que eu acumulava na viagem de mochila, lugares conhecidos em comum no Brasil e os planos que tinha para conhecer Paris surgiram muitas ofertas de apoio e uma sugestão adicional ao roteiro: Monte Saint Michel na Bretanha.
Não precisaram de muito esforço pra me convencer, munidos de muito orgulho do lugar, informações históricas e livros com fotos e detalhes eu acabei a visita me perguntando como eu não havia visto informações sobre lá antes, certamente era um lugar mais interessante que outros visitados, e não precisaria de muito tempo ou dinheiro pra visitar, só desfazer boa parte do que já tinha feito para ficar em Paris até o voo 😃.
Meu francês inferior ao básico não ajudou muito na conversa no albergue, sempre que eu tentava explicar que precisava reaver parte do dinheiro já pago (e argumenta falando inglês) o atendente passava para o francês me deixando certamente com uma expressão de desespero, por mais de duas horas esse impasse persistiu e eu quase desisti, foi quando coloquei no balcão um cartão postal do Monte Saint-Michel, presente dos primos recém conhecidos e o caminho da conversa virou completamente, ao ver a foto o atendente mostrou grande interesse naquela foto e perguntou se eu conhecia o lugar… foi a deixa pra ele ouvir finalmente minha explicação, precisava cancelar uma semana de albergue em Paris para poder conhecer o lugar foi minha resposta.
Sem demora o atendente pegou minha ficha, alterou as datas abriu o caixa e me deu o dinheiro, não preciso dizer que agora minha cara certamente demonstrava espanto, e meio gaguejando consegui perguntar o que havia mudado.
Simples, respondeu ele, eu nasci em Saint-Malo (cidade ao lado do Mont-Saint Michel) e “o lugar é maravilhoso, acho realmente que você tem que conhecer lá”. E minha sorte havia novamente me ajudado, como eu poderia imaginar que tanto sincronismo poderiam me levar a um lugar maravilhoso, vejam os fatores: Tempo adicional devido a contratempos de visto + Primos desconhecidos que me receberam de braços abertos e se interessaram pelas minhas aventuras + atendente do albergue que nasceu bem onde meus primos sugeriram visitar + custos da viagem inferiores aos custos do albergue em Paris, tanta coincidência, nem loteria, não acha?
O Mont-Saint Michel guarda muita história, é uma espécie de ilha na praia (ligada ao continente por apenas uma estrada atualmente, menos de 1 km), sobre essa ilha uma abadia fortificada foi erguida. A natureza nesse lugar é bastante previsível, todos os dias a maré baixa deixando o Monte acessível a pé pela praia, mas a noite a maré sobe alguns metros rapidamente, tornando o lugar isolado.
Então agora que já imaginou o lugar, imagine um exército antigo, com seus soldados e cavalos, catapultas ou canhões rudimentares tentando invadir o lugar, digo tentando porque porquê por séculos não conseguiram, os habitantes do monte precisavam apenas resistir durante a maré baixa, se não se atentassem a isso provavelmente seriam vencidos pelo mar, além disso quem estava protegido pelo Monte ainda podia ter boas noites de sono, recuperando as energias para a batalha do dia seguinte.
Sua posição estratégica na Bretanha era mais que importante, França e Inglaterra até hoje tem suas briguinhas e protagonizaram guerras constantes por muitos séculos, como a guerra dos 100 anos, não exagero em acreditar que o Monte Saint Michel desempenhou papel crítico na história.
Além disso o lugar é uma construção impressionante, a abadia medieval encrustada nas pedras da ilhota é um feito da engenharia, paredes com metros de espessura, jardins e vielas me levaram ao passado.
No continente uma cidadela medieval é igualmente charmosa, Saint-Malo é uma cidade de praia, teoricamente, mas com inverno duro, vento e neve dominavam quando estive por lá, mas com casas em pedra e ruas estreitas, muito aconchegante.
Minha ida e retorno da Bretanha levou no total três dias, fiquei dois por lá, tempo suficiente pra ver as marés e curtir um pouco a cidadela, valeu muito a pena.