Yangon em Myanmar

Eu havia visitado alguns templos budistas em São Paulo, diversas vertentes, algumas coisas me agradaram, mas não me convenceram a seguir o budismo como religião, eu precisava de algo mais raiz pra decidir se era esse o caminho que queria me dedicar. Já me considero um forte simpatizante do Taoísmo, a questão é se encontraria no budismo a religião que buscava.
 
Então ao ter a oportunidade de umas férias um pouquinho mais longas decidi conhecer um país budista e a decisão foi rápida ao encontrar Myanmar na lista, esse país permaneceu isolado, fechado a estrangeiros por décadas por um regime totalitário, naquele momento apenas 2 anos haviam passado desde a mudança política local e isso me parecia insuficiente para mudar os costumes locais, era uma oportunidade de conhecer um local ainda pouco influenciado pela globalização.
 
Não era uma tarefa fácil, pra começar um visto era exigido, sem consulados por aqui a internet ajudou, mas demorou semanas 😃, o idioma local é totalmente fora de qualquer conhecimento que eu tivesse, não apenas a sonoridade, mas o alfabeto era estranho e até o modo que era escrito, as frases me lembravam mais bordados que palavras, e claro, como pra muitos dos destinos que escolhi, somente 1 agência no Brasil considerava roteiros pra lá, mas que graça tem uma viagem sem algum desafio, certo?
 
Talvez vendo o cenário acima entenda porque eu sorria a toa quando pousei em Myanmar, o guarda de fronteira até me questionou porque eu parecia tão feliz, me atormentou com um longo questionário e embora tenha saído de Bangkok logo após o almoço, e o voo tenha durado pouco mais de 1 hora, já estava anoitecendo quando saí do aeroporto, meu translado me recebeu tranquilamente e lá fomos pro hotel.
 
Ah, o hotel merece uma nota, claramente de influência colonial inglesa, tinha mais de 50 anos lá, o quarto grande e arejado me surpreendeu, praticamente era maior que meu apartamento em Sampa, com ótima vista para a cidade e um clima que lembrava os filmes clássicos sobre o oriente, só um contratempo, o atendente fez questão de me dizer pelo menos 5 vezes para não andar a noite naquele bairro, e quando eu desobedeci no segundo dia, voltando tarde de meu passeio, encontrei as portas trancadas e precisei insistir para abrirem, felizmente não entendi uma palavra sequer da longa bronca que acho ter tomado.
 
Uma outra curiosidade foi uma imensa lista telefônica, amarela, que ficava na recepção, fazia alguns anos que não via uma daquelas e ela simbolizava um ponto importante pra mim, a globalização (e a internet) ainda não haviam chegado muito fortemente por ali, embora eu não pretendesse usá-la, ela me fez ainda mais feliz.
 
Na primeira noite, entretanto, da janela do quarto uma visão incrível foi o primeiro presente da viagem pra Myanmar, ao longe um enorme pagode dominava o horizonte iluminado em tons avermelhados, era extasiante, fiquei horas observando o mesmo, mal desfiz a mala.
Logo cedo quando o guia chegou eu já queria trocar qualquer que fosse o destino para conhecer o tal Pagode, mas fui tranquilizado, o destino da manhã era ele!
 
E assim fomos para o templo de Shwedagon, atração principal da cidade e não era um Pagode, eram mais de MIL, sim, o que vi ao longe era apenas o principal, mas este estava rodeado por milhares de pagodes menores, pequenos templos de arquitetura variada e mantendo a linha vista em Bangkok, detalhes impressionantes.
 
O acesso ao templo também impressionava, a entrada sudeste (por onde eu entrei) parecia totalmente restaurada, as demais passavam por obras (curioso também era não seguirem os pontos cardeais e sim os colaterais NE, SE, SW e NW), mas essas entradas eram amplas escadas, onde tudo, do chão ao teto era trabalhado com algum detalhe ou pintura ou escultura ou tudo junto, fantástico, subimos calmamente apreciando cada detalhe, procurem detalhes nas fotos, certamente acharão algum que eu ainda não tenha visto.
 
No topo um mundo novo, diferente, pagodes de todos os tipos, tamanhos, cores e formatos (embora praticamente todos tivessem pontas), eu nem sei dizer quanto andei nesse lugar, por quase 8 horas entrei em todos os becos que vi, observei rituais dos mais variados e até fiz alguns, havia muita gente por lá, mas praticamente locais, contei nos dedos os estrangeiros que encontrei. E tirei milhares de fotos, nem percebia naquele momento que pareceriam tão semelhantes numa telinha, na seleção que fiz aqui deixei uma pequena parte, e se parecerem muito iguais umas as outras, recomendo olhar com mais calma 😃 
 
Como saímos cedo para o templo ainda me sobrou um tempinho no fim da tarde para visitar mais alguns templos menores ao redor do principal, nesses havia um comércio de rua bem intenso, mas menos gente, os vendedores mostravam grande simpatia mas não era muito fácil a comunicação, praticamente com mímicas, eles sempre queriam falar comigo diretamente, ignorando o guia, 😃  foi divertido demais.
 
No fim da tarde voltei ao templo principal, afinal eu ainda não havia visto o mesmo a noite, sabia que seria iluminado e minha paixão por fotos noturnas me motivava. O movimento no templo era outro, bem menos gente e um movimento intenso de voluntários (segundo o guia) limpavam e preparavam a iluminação, sim preparavam, a  iluminação do templo não era feita por luz elétrica, milhares de tijelinhas eram colocadas ao redor do templo e abastecidas com querosene (ou algo do tipo) e por fim acesas, isso explicava o fantástico tom avermelhado que eu havia visto na noite anterior, mas foi muito interessante ver pertinho também. Fiquei feliz com as fotos.
 
Estava tão agitado com o dia que resolvi voltar a pé pro hotel, ignorando os avisos do atendente, afinal eram 4km segundo o mapinha (em papel) que eu havia recebido, além do que estava sozinho, e não tinha ideia de como chamar um taxi naquele idioma, se encontrasse um eu estava preparado com o cartão do hotel, mas curiosamente não vi taxi algum durante todo o trajeto.
 
O guia muito a contra gosto havia me deixado no fim do dia, a caminhada foi bem agradável, cruzei uma região nobre da cidade, onde ficavam embaixadas e outras casas fantásticas, não tive qualquer problema, nem ameaça disso, as ruas eram bem desertas embora amplas e arborizadas, só tive de ouvir uma bronquinha no hotel 😃.
 
No segundo dia a promessa era conhecer mais da cidade, menos dos templos, fomos então para uma região central mais comercial, o caos das lojas, barraquinhas na calçada e pessoas com roupas estranhas lembrava um pouco o comercio popular do centro de Sampa, só as roupas que não, em Myanmar os homens usam uma espécie de saia longa também, era estranho, outra coisa que reparei eram os dentes muito escuros dos homens, segundo soube era comum o habito de mascar fumo, não sei dizer se isso é de alguma forma agradável, mas destrói qualquer sorriso com certeza.
 
Na região central outro templo me chamou a atenção, muito colorido e repleto de esculturas bizarras o templo era pra Kali, para quem não conhece esse é a deusa hindu que representa a mãe natureza e a criação, mas também a destruição, a guerra e a morte, muito popular o templo estava cheio.
 
Mas ao lado do templo a outra face de um povo isolado e governado pelo totalitarismo se apresentava, prédios populares em péssima conservação e claramente superpovoados mostravam a pobreza do povo por ali, cena triste de se lembrar.
 
Continuamos andando pela cidade, em particular, próximo a um parque que me agradou uma calçada toda trabalhada em mosaicos me encantou, não haviam dois quadrados iguais por centenas de metros, enfim, algumas regiões mostravam resquícios de uma colônia britânica, mas também vi regiões bonitas e bem cuidadas, parques repletos de pessoas namorando e olhares curiosos em minha direção, 😃  meu tempo em Yangon estava terminando, no dia seguinte seguiria pro norte de Myanmar, para a antiga capital, onde novas surpresas me aguardavam.